sábado, 9 de fevereiro de 2013

O autoconhecimento e o conhecimento de Deus

[R.C. Sproul]

Quando um bebe nasce, sua entrada neste mundo geralmente é acompanhada por um forte tapa no traseiro. A resposta normal da criança é um estridente grito de protesto. Por que o bebe chora? O choro é uma resposta à dor? Ou o medo? Ou de raiva?

Talvez o choro seja provocado por todas as razões acima. Nossa entrada no mundo é marcada por som e fúria. Esse protesto inicial é considerado por alguns como a soma não só do significado do nascimento, mas do significado de toda a vida. Macbeth ponderou:

A vida não é mais do que um caminhar nas sombras,
um pobre ator que anda pomposo e aborrecido pelo palco,
e depois não é mais ouvido; é como uma fábula
contada por um idiota, cheia de sons e de paixão,
mas sem nenhum significado.

Significar nada é ser total e completamente insignificante. Ser insignificante é ser sem sentido. Ser sem sentido é ser sem valor ou sem dignidade.

Minha significação e a sua estão relacionadas com as perguntas quem somos e o que somos nós. É uma questão de identidade. Minha identidade, em última análise, está ligada ao meu relacionamento com Deus. Não posso entender quem ou o que sou sem entender quem ou o que Deus é.

Existe uma dependencia mútua entre nosso conhecimento de nós mesmos e nosso conhecimento de Deus. Assim que me torno consciente de mim mesmo, como indivíduo, descubro que não sou Deus; sou uma criatura. Tenho uma data de nascimento, ou seja, um momento em que minha vida começou aqui na terra. A lápide no meu túmulo não terá gravada eternidade como meu ponto de partida. […]

Minha consciência de que sou uma criatura dirige meus pensamentos até o Criador, ou para “cima”. Não posso contemplar Deus ou qualquer outra coisa além de mim até que primeiro esteja consciente de mim mesmo. Mesmo assim, não posso captar plenamente o sentido do meu próprio ser enquanto não entender a mim mesmo em relação a Deus. Finalmente então, a antropologia, o estudo da humanidade, é uma subdivisão da teologia, o estudo de Deus.

A crise da humanidade moderna encontra-se na ruptura entre a antropologia e a teologia – entre o estudo dos seres humanos e o estudo de Deus. Quando nossa história é contada isoldamente ou divorciada da história de Deus, então realmente ela se torna “uma fábula, contada por um idiota, cheia de sons e de paixão, mas sem nenhum significado”. Se somos considerados sem qualquer referencia a Deus, tornamo-nos uma “paixão inútil”, como declarou o filósofo Jean-Paul Sartre.

O que é uma "paixão inútil"? Paixão é um sentimento intenso. A vida humana é marcada por sentimentos intensos, que incluem paixões como amor, ódio, medo, culpa, ambição, cobiça, inveja, ciúme e muitas outras. Como criaturas, temos sentimentos intensos concernentes à nossa vida. Uma pergunta nos assalta constantemente: Será que todos esses sentimentos são inúteis? Será que todo nosso esforço e cuidado é meramente um exercício de futilidade, uma excursão à nulidade?

O significado da nossa vida está em jogo. Nossa dignidade está em questão. Se os seres humanos são considerados isoladamente, separados do relacionamento com Deus, então permanecem sozinhos e insignificantes. Se não somos criaturas feitas por Deus e relacionadas com ele, somos meros acidentes cósmicos. Nossa origem seria insignificante e nosso destino seria igualmente insignificante. Se emergirmos do limo por acidente e finalmente nos desintegramos num vácuo ou num abismo cheio de nada, então vivemos nossas vidas entre dois extremos de absoluto vazio. Somos zeros despojados, desnudos e desprovidos de dignidade e de valor.

Atribuir dignidade temporária a um ser humano, quer dizer, entre os dois extremos de uma origem sem sentido e um destino sem sentido é entregarmo-nos a um sentimento simples: importunamo-nos a enganar a nós mesmos.

Nossa origem e nosso destino estão atados a Deus. O significado único e final que podemos ter tem de ser teológico. A pergunta que formulamos foi feita pelo salmista:

Quando contemplo os teus céus, obra dos teus dedos, e a lua e as estrelas que estabeleceste, que é o homem, que dele te lembres? E o Filho do homem, que o visites? Fizeste-o, no entanto, por um pouco, menor do que Deus e de glória e de honra o coroaste.” (Salmo 8.3-5)

Ser criado por Deus é estar relacionado com Deus. Esse relacionamento inescapável assegura que não somos nenhum ruído ou sentimento inútil. Na criação, recebemos uma coroa de glória. Uma coroa de glória é uma tiara de dignidade. Com Deus, temos dignidade; sem Deus, não somos nada.



SUMÁRIO
1. Não podemos conhecer a Deus sem primeiro estarmos conscientes de nós mesmos.

2. Não podemos conhecer profundamente a nós mesmos sem primeiro conhecer a Deus.


3. Seres humanos relacionados com Deus: Origem com propósito + destino com propósito = Vida significativa.

4. Seres humanos sem relação com Deus: Origem sem sentido + destino sem sentido = Vida sem sentido.

FONTE:  SPROUL, R. C. Verdades essenciais da fé cristã: doutrinas básicas em linguagem simples e prática. São Paulo: Cultura Cristã, 1999. 3 v.

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