sexta-feira, 30 de maio de 2014

O legado do Antigo Testamento na formação da Igreja


A Igreja é criação de Cristo e remonta à época de Jesus de Nazaré, porém ela tem raízes no Antigo Testamento e não pode ser bem compreendida sem essa base no passado. Isso é teologicamente verdadeiro, porque o conceito de povo de Deus, obviamente, já existia no período do Antigo Testamento, assim como no Novo.

É verdadeiro também no aspecto linguístico, que, uma vez que a palavra grega para igreja (ekklesia) aparece muitas vezes em relação a Israel na tradução grega do Antigo Testamento (a chamada Septuaginta), ela se tornou conhecida dos escritores do Novo Testamento. As passagens em que ekklesia aparece podem, supostamente, ter exercido uma influência no pensamento dos escritores do Novo Testamento.

Na Septuaginta, o termo ekklesia, geralmente, traduz o termo hebraico qhl, que, assim como a palavra grega, refere-se àqueles que são congregados por Deus como Sua possessão especial.

Isso diz respeito às primeiras aparições dessa palavra: com a frase no dia da congregação (Dt 9.10b; 10.4; 18.16), o termo faz menção à nação de Israel congregada no monte Sinai. Esse é também seu significado no Salmo 22, no qual o termo congregação volta a aparecer (v.22,25), bem como é a ideia que está por trás da referência de Estevão à congregação em seu sermão no livro de Atos: "Este é o que esteve entre a congregação no deserto, com o anjo que lhe falava no monte Sinai, e com nossos pais" (At 7.38a).

Nessas passagens e em outras, o elemento-chave é o chamado de Deus, seguido da resposta dos que são convocados e do pacto solene do Senhor para abençoá-los – para ser seu Deus, eles serem Seu povo.

Podemos observar uma ilustração desses elementos no chamado de Abraão, com quem a congregação do Antigo Testamento começou. Somos informados de que o Senhor apareceu a Abraão dizendo:

Ora, o SENHOR disse a Abrão: Sai-te da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai, para a terra que eu te mostrarei. E far-te-ei uma grande nação, e abençoar-te-ei e engrandecerei o teu nome; e tu serás uma bênção.
Gênesis 12.1,2


Nessa maneira, a iniciativa foi toda de Deus, uma vez que foi Ele quem procurou e chamou Abraão, e não o contrário. De novo, vemos o começo da promessa ou do pacto:


Então, disse a Abrão: Saibas, decerto, que peregrina será a tua semente em terra que não é sua; e servi-los-á e afligi-lo-ão quatrocentos anos. Mas também eu julgarei a gente à qual servirão, e depois sairão com grande fazenda. Naquele mesmo dia, fez o Senhor uma concerto com Abrão, dizendo: À tua semente tenho dado esta terra, desde o rio do Egito até ao grande rio Eufrates.
Gênesis 15.13,14,18

Quanto a mim, eis o meu concerto contigo é, e serás o pai de uma multidão de nações. E estabelecerei o meu concerto entre mim e ti e a tua semente depois de ti em suas gerações, por concerto perpétuo, para te ser a ti por Deus e à tua semente depois de ti. E te darei a ti e à tua semente depois de ti a terra de tuas peregrinações, toda a terra de Canaã em perpétua possessão, e ser-lhes-ei o seu Deus.
Gênesis 17.4,7,8

A resposta de Abraão foi crer em Deus (Gn 15.6) e adorá-lo (Gn 12.8). Percebemos o mesmo modelo no relacionamento de Deus com Isaque, o filho de Abraão, e com Jacó, seu neto. Mais tarde, houve um chamado especial para os descendentes do patriarca, quando eram escravos no Egito. Naquela ocasião, Deus disse a Moisés:


E disse o Senhor: Tenho visto atentamente a aflição do meu povo, que está no Egito, e tenho ouvido o seu clamor por causa dos seus exatores, porque conheci as suas dores. Portanto, desci para livrá-lo da mão dos egípcios e para fazê-lo subir daquela terra a uma terra boa e larga, a uma terra que mana leite e mel; ao lugar do cananeu, e do hebreu, e do amorreu, e do ferezeu, e do heveu, e do jebuseu.
Êxodo 3.7,8
Finalmente, encontramos uma chamada e promessa a Israel, seguidas do cativeiro babilônico:

Portanto, eis que dias vêm, diz o SENHOR, em que nunca mais se dirá: Vive o Senhor, que fez subir os filhos da terra do Egito. Mas: vive o SENHOR, que fez subir os filhos de Israel da terra do Norte e de todas as terras para onde os tinha lançado; porque eu os farei voltar à sua terra, que dei a seus pais.
Jeremias 16.14,15
Em cada uma dessas passagens, há a criação de uma ekklesiauma congregação daqueles que são chamados para se tornar um povo especial para Deus, longe de um relacionamento normal com o mundo. Esse chamado é seguido de promessas especiais e tem como resposta a fé, a adoração, o amor e a obediência da parte dos que aceitam o Senhor.

Fonte: BOICE, James Montgomery. Fundamentos da fé cristã: um manual de teologia ao alcance de todos. Rio de Janeiro: Central Gospel, 2011. 632 páginas

sexta-feira, 23 de maio de 2014

Cidadania Cristã


Os cristãos que vivem no mundo de hoje têm tanto a responsabilidade de serem fiéis a Deus quanto a responsabilidade de serem cidadãos produtivos na sociedade. Daniel, Sadraque, Mesaque e Abede-Nego são bons exemplos de como é possível conseguir esse equilíbrio.

A maior prioridade para todo cristão é viver dentro da vontade de Deus. As leis sociais criam uma estrutura prática que transmite as ideias de uma sociedade sobre o que é mutuamente benéfico para todos os cidadãos. Os cristãos devem estar comprometidos em valorizar e obedecer esse consenso moral. Mas além disso, o cristão tem uma voz de maior autoridade a qual deve obedecer.

Os cristãos podem e devem contribuir para a sociedade. Daniel e seus amigos tornaram-se altos oficiais do governo e serviram da melhor maneira que lhes foi possível. Mas se a sociedade exigia alianças ou ações que interferiam com o seu serviço a Deus e seu comprometimento de viver dentro da vontade dele, eles silenciosamente desobedeciam essas leis humanas.

Assim, os cristãos recebem ordens superiores. O mundo precisa de cristãos que expressem suas opiniões e tomem uma posição em relação a aspectos da sociedade. Jesus chama sua igreja para ser o sal do mundo, o que envolve trabalhar como um agente purificante e que dá sabor (Mt 5.13). Como luz do mundo, os cristãos devem refletir e proclamar a salvação que Cristo morreu para oferecer (Mt 5:14-16).


Referência: ARNOLD, Bill T.; BEYER, Bryan E.. Descobrindo o Antigo Testamento: Uma perspectiva cristã. São Paulo: Cultura Cristã, 2001.


segunda-feira, 12 de maio de 2014

Evidência da veracidade de nosso Cristianismo

[Jonathan Edwards]

"Aquele, entretanto, que guarda a sua palavra, nele verdadeiramente tem sido aperfeiçoado o amor de Deus" (I Jo. 2:4-5).


A prática cristã aperfeiçoa fé e amor. São como uma semente. A semente não chega à perfeição por ser plantada na terra. Nem por desenvolver raízes e brotos, ou por sair do chão, nem por desenvolver folhas e botões. Entretanto, quando produz frutos bons e maduros, chegou à perfeição - completou sua natureza. O mesmo ocorre com fé e amor e todos os outros dons. Chegam à perfeição em frutos bons e maduros da prática cristã. A prática, então, deve ser a melhor evidência de que esses dons existem.

As Escrituras dão mais ênfase à pratica do que a qualquer outra evidência de salvação. Espero que isso esteja claro agora. Temos que nos manter nessa ênfase. É perigoso dar importância a coisas que a Bíblia não endossa. Teremos perdido nosso equilíbrio bíblico se dermos maior importância aos sentimentos e experiências que não se expressem em obediência prática. Deus sabe o que é melhor para nós, e tem salientado certas coisas porque precisam ser salientadas. Se ignorarmos a ênfase clara, de Deus, na prática cristã, e insistirmos em outras coisas como testes de sinceridade, estamos no caminho da ilusão e hipocrisia.

As Escrituras falam muito claramente sobre a prática cristã como o verdadeiro teste de sinceridade. Não é como se isso fosse alguma doutrina obscura, somente mencionada algumas vezes em passagens difíceis. Suponhamos que Deus desse uma revelação nova hoje, e declarasse: "Conhecereis meus discípulos por isso, sabereis que são da verdade por isso, sabereis que são Meus por isso" - e então desse uma marca ou sinal especial. Não veríamos nisso um teste claro e enfático de sinceridade e salvação? Bem, isto é o que tem ocorrido! Deus tem falado dos céus - na Bíblia! Ele nos disse muitas e muitas vezes que a prática cristã é a prova mais alta e melhor da fé verdadeira. Vejam como Cristo repete isso no texto do capítulo 14 do Evangelho de João: "Se me amais, guardareis os meus mandamentos" (v. 15). "Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda, esse é o que me ama" (v. 21). "Se alguém me ama, guardará a minha palavra" (v. 23). "Quem não me ama, não guarda as minhas palavras" (v. 24). E no capítulo 15: "Nisto é glorificado meu Pai, em que deis muito fruto; e assim vos tornareis meus discípulos" (v. 8). "Vós sois meus amigos, se fazeis o que eu vos mando" (v. 14). E encontramos a mesma coisa em I João: "Ora, sabemos que o temos conhecido por isto: se guardamos os seus mandamentos" (2:3). "Aquele, entretanto, que guarda a sua palavra, nele verdadeiramente tem sido aperfeiçoado o amor de Deus. Nisto sabemos que estamos nele" (2:5). "Não amemos de palavra, nem de língua, mas de fato e de verdade. E nisto conheceremos que somos da verdade" (3:18-9). Acaso não está claro?

Deus nos julgará por nossa prática no Dia do Juízo. Ele não pedirá que demos nosso testemunho pessoal. Não examinará nossas experiências religiosas. A evidência pela qual o Juiz nos aceitará ou rejeitará será a nossa prática. Essa evidência, é claro, não será para o benefício de Deus. Ele conhece nossos corações. Mesmo assim, Ele exporá a evidência de nossa prática por causa da natureza aberta e pública do julgamento final. "Porque importa que todos nós compareçamos perante o tribunal de Cristo para que cada um receba segundo o bem ou mal que tiver feito por meio do corpo" (II Cor. 5:10). Se a nossa prática é a evidência decisiva que Deus usará no Dia do Juízo, é o teste que deveríamos aplicar a nós mesmos aqui e agora.

Conforme esses argumentos, penso que está claro que a prática cristã (como a defini) é a melhor evidência, para nós mesmos e para os outros, que somos verdadeiros cristãos.

http://www.jonathanedwards.com.br/

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Por que alguns acham a Bíblia difícil


[A.W.Tozer]

Ninguém pode negar que algumas pessoas acham a Bíblia difícil. Os testemunhos quanto às dificuldades encontradas na leitura bíblica são inúmeros e não podem ser desconsiderados levianamente.

Na experiência humana existe geralmente um complexo de motivos e não um só motivo para tudo; o mesmo acontece com as dificuldades que encontramos na Bíblia. Não se pode dar uma resposta instantânea para a pergunta: Por que a Bíblia é difícil de entender? Qualquer resposta irrefletida tem toda probabilidade de estar errada. O problema não é singular, mas plural, e por esta razão o esforço de encontrar para ele uma solução única será frustrado.

Apesar desse raciocínio, ouso dar uma resposta curta para a pergunta, e embora esta não responda a tudo, contém boa parte da solução do problema envolvido numa questão assim complexa. Acredito que achamos a Bíblia difícil porque tentamos lê-la como leríamos qualquer outro livro, mas ela não se assemelha a nenhum outro livro.

A Bíblia não é dirigida a qualquer um. Sua mensagem tem como alvo alguns escolhidos. Quer esses poucos sejam escolhidos por Deus num ato soberano de eleição ou por corresponderem a determinadas qualificações, deixo para cada um decidir como possa, sabendo perfeitamente que sua decisão será determinada pelas suas crenças básicas sobre assuntos tais como predestinação, livre-arbítrio, os decretos eternos e outras doutrinas relativas. Mas o que quer que tenha tido lugar na eternidade, o que acontece no tempo fica evidente: alguns creem e outros não; alguns são moralmente receptivos e outros não; alguns têm capacidade espiritual e outros não. São para os primeiros que a Bíblia foi escrita, os demais irão lê-la inutilmente.

Sei que alguns leitores vão apresentar objeções vigorosas neste ponto, e as razões para elas são fáceis de descobrir. O cristianismo de hoje se concentra no homem e não em Deus. O Senhor precisa aguardar com toda paciência e até mesmo respeito, sujeitando-se aos caprichos humanos. A imagem de Deus aceita pelo povo é a de um Pai aflito, esforçando-se em desespero amargurado para fazer com que as pessoas aceitem um Salvador de que elas não sentem necessidade e em quem têm pouco interesse. A fim de persuadir essas almas auto-suficientes a responderem às suas ofertas generosas, Deus fará quase tudo, usando até mesmo métodos de venda especiais e lhes falando da maneira mais íntima possível. Este ponto de vista é, naturalmente, um tipo de religião romantizada que consegue fazer do homem a estrela do espetáculo, embora usando com freqüência termos elogiosos e até mesmo embaraçosos em relação a Deus.

A ideia de que a Bíblia e dirigida a todos criou confusão dentro e fora da igreja. O esforço de aplicar os ensinamentos contidos no Sermão do Monte às nações não-regeneradas do mundo é um exemplo disto. Os tribunais e poderes militares da terra são instados a seguirem os ensinos de Cristo, algo evidentemente inviável para eles. Citar as palavras de Cristo como diretriz para policiais, juízes e militares é interpretar absolutamente errado essas palavras e revelar completa falta de compreensão dos propósitos da revelação divina. O convite gracioso de Cristo é estendido aos filhos da graça e não às nações gentias cujos símbolos são o leão, a águia, o dragão e o urso.

Deus não só dirige suas palavras de verdade aos que têm capacidade para recebê-las, como também as oculta aos demais. O pregador faz uso de histórias para esclarecer a verdade, nosso Senhor usou-as muitas vezes para ocultá-la. As parábolas de Cristo foram o exato oposto da moderna "ilustração" que serve para esclarecer; as parábolas eram "ditos obscuros" e Cristo afirmou que fazia uso delas algumas vezes a fim de que seus discípulos pudessem compreender, mas não os inimigos. (Veja Mateus 13:10-17.) Assim como a coluna de fogo iluminava Israel, mas servia para ocultá-los aos olhos dos egípcios, as palavras do Senhor brilham no coração do seu povo embora deixem o incrédulo presunçoso nas trevas da noite moral.

O poder salvador da Palavra fica reservado para aqueles a quem ele se destina. O segredo do Senhor está com aqueles que O temem. O coração impenitente não descobrirá na Bíblia senão um esqueleto de fatos sem carne, vida, ou fôlego de vida. Shakespeare pode ser apreciado sem necessidade de arrependimento; podemos entender Platão sem acreditar numa palavra que ele diz; mas a penitência e a humildade juntamente com a fé e a obediência são necessárias a fim de que as Escrituras possam ser compreendidas corretamente.

Nos assuntos naturais, a fé segue-se à evidência, sendo impossível sem ela, mas no reino do espírito, ela precede o entendimento; e não se segue a ele. O homem natural precisa saber a fim de acreditar; o homem espiritual precisa crer para vir a conhecer. A fé que salva não é uma conclusão extraída da evidência; mas uma coisa moral, uma coisa do espírito, uma infusão sobrenatural de confiança em Jesus Cristo, um perfeito dom de Deus.

A fé salvadora se baseia na Pessoa de Cristo; ela leva imediatamente a uma rendição do nosso ser total a Cristo, cujo ato é impossível ao homem natural. Crer corretamente é um milagre comparável ao da ressurreição de Lázaro sob a ordem de Cristo. A Bíblia é um livro sobrenatural e só pode ser entendido com ajuda sobrenatural.


TOZER, Aiden Wilson. O melhor de A.W.Tozer: textos inesquecíveis de um grande pregador. Editora Mundo Cristão, 2007